Perplexidade e retrocesso em decisão liminar sobre MP 936/2020

No apagar das luzes do dia 06 de abril de 2020 medida liminar concedida pelo STF em Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido Político REDE SUSTENTABILIDADE parece ter aniquilado a Medida Provisória 936/2020 publicada no dia 01.04.2020 e ter deixado milhares de trabalhadores brasileiros entregues à própria sorte. 

O atual estado de calamidade pública decorrente do GRAVE problema sanitário de escala MUNDIAL obrigou governos de inúmeros países a adotar medidas restritivas de isolamento, com a manutenção da população em casa, salvo daqueles que realizam atividades legalmente qualificadas como essenciais, com o fechamento de empresas nos mais diversos setores da economia, tudo isso no intuito de frear a disseminação do COVID-19, sendo este também o cenário vivenciado no BRASIL.

Na tentativa de minimizar os impactos negativos causados pelo isolamento e paralisação dos negócios e de salvaguardar empregos, o Governo Federal editou uma série de medidas provisórias, e, em especial, a 936/2020 que instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e o pagamento de benefício emergencial, admitindo a flexibilização de direitos trabalhistas através de acordos individuais celebrados diretamente entre o empregador e o empregado.

A MP 936/2020 autorizou a suspensão temporária do contrato de trabalho, pelo prazo máximo de sessenta dias, com o pagamento de benefício emergencial pelo Governo, equivalente a 70% ou 100% do valor do seguro-desemprego a que o empregado teria direito, e a redução da jornada de trabalho e do salário, de forma proporcional, com a preservação do valor do salário-hora, apenas determinando que o Sindicato Profissional fosse, a posteriori, comunicado do ajuste.

Portanto, empregado e empregadores estavam livres para ajustar as novas condições e preservar os postos de trabalho, assegurando àqueles a manutenção do seu negócio e a estes não apenas os seus postos de trabalho como a suas subsistências e de suas famílias.

Contudo, de forma surpreendente o STF, em decisão de natureza cautelar concedida pelo Min. Ricardo Lewandowski na ADI 6.363/DF, fez letra morta da MP 936/2020 quando, dando interpretação conforme à Constituição, decidiu e estabeleceu que os acordos individuais “apenas surtirão efeitos jurídicos plenos após manifestação dos sindicatos dos empregados”, ainda que essa manifestação seja o silêncio sindical (aceite tácito), sob pena de invalidade.

A decisão causa perplexidade sob inúmeros vieses: (i) político, pois era de se esperar que houvesse interlocução entre os Poderes do Estado para o bem da sociedade e segurança jurídica dos jurisdicionados. Se o executivo edita medidas urgentes que começam a ser questionadas judicialmente com a chancela da mais alta Corte Brasileira que segurança se terá para implementá-las? (ii) econômico e social, pois, privados da perspectiva de validamente suspender os contratos de trabalho ou reduzir proporcional jornada e salário, e sem condições de suportar os ônus decorrentes de uma negociação coletiva, a consequência inexorável será o desemprego para milhões de famílias brasileiras e uma profunda recessão; (iii) prática: quem pagará os salários dos empregados no período que decorrer entre o ajuste individual e a manifestação do Sindicato (ou a sua ausência) e  o que acontecerá se o Sindicato não convalidar o acordo individual? Os Sindicatos estão abertos, funcionando normalmente? Como se dará a negociação? O que fazer com os mais de 7.000 acordos individuais já registrados, segundo dados do Ministério da Economia? (iv) jurídica posto que a MP 936/2020 não nos parece padecer de inconstitucionalidade: nenhum princípio constitucional é absoluto.

A suspensão do contrato de trabalho não tem assento na Constituição Federal, tampouco se extrai dela qualquer condicionante à prévia negociação coletiva. Tanto assim que inúmeras normas infraconstitucionais estabeleceram hipóteses de suspensão do contrato de trabalho, a exemplo do que ocorre quando o empregado está em gozo de benefícios previdenciários como auxílio-doença ou auxílio-maternidade, e não há, nestes casos, o pagamento de qualquer fração salarial pelo empregador. Portanto, o que a MP 936/2020 fez foi criar NOVA hipótese de suspensão do contrato de trabalho.

O contrato de trabalho é sinalagmático por essência, havendo uma relação de prestação e contraprestação. É por esta razão que na suspensão contratual o empregado não trabalha e o empregador não lhe remunera. Contudo a MP mitigou os efeitos deletérios da suspensão contratual quando estabeleceu o pagamento de benefício emergencial e ainda exigiu do empregador, mesmo sem contrapartida oferecida pelo empregado, a manutenção dos benefícios e o pagamento de 30% do valor do salário para empresas cujo faturamento anual seja superior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais).

Portanto, se a Constituição Federal não trata da suspensão do contrato de trabalho, nem mesmo para condicioná-la a prévia negociação coletiva, a pecha de inconstitucionalidade não é razoável.

Quanto à redução da jornada e do salário a MP 936/2020 determinou a preservação do valor do salário-hora, o que, a rigor, não pode ser taxado de redução salarial e, portanto, não se vislumbra ofensa ao princípio constitucional de irredutibilidade salarial e, pois, a necessidade de negociação coletiva. 

Além disso, nenhum direito ou princípio constitucional é absoluto. A supremacia das negociações coletivas como vetor de flexibilização de direitos trabalhistas cede e deve ser sopesado com outros como o da garantia do emprego, o da função social da empresa, o da valorização do trabalho e, em última análise, o da dignidade da pessoa humana que, neste momento de pandemia mundial e de grave crise econômica, significa ter um posto de trabalho e fonte de renda quando o estado de isolamento social for superado.

A negociação coletiva é, em regra, conflituosa e envolve, quase sempre, a concessão de benefícios em troca daquilo que se quer. Ora, o momento exige rapidez, imediatidade e não há espaço para negociatas. O que fez o STF, sem analisar os impactos pragmáticos da sua decisão, foi priorizar os Sindicatos e as negociações coletivas, tão combalidos pela reforma trabalhista de 2017, em detrimento de toda a sociedade brasileira e, em especial, dos milhões de trabalhadores cuja última esperança de manter seus empregos foi pelo ralo junto com a MP 936/2020.

Renata Azi é advogada, sócia do Pessoa & Pessoa Advogados Associados, graduada pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia e Pós-Graduada em Direito Material e Processual do Trabalho.

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