É possível a aplicação da redução de salário/jornada prevista na MP 936 aos empregados inseridos no regime do art. 62 da CLT (cargo de confiança, serviço externo e teletrabalho)?

Com o objetivo de preservar os empregos e minorar os efeitos econômicos devastadores da pandemia da Covid-19, o Governo Federal editou a Medida Provisória nº 936/2020, instituindo o chamado Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda,  que propicia aos empregadores duas alternativas para evitar a despedida do empregado: (i) suspender os contratos de trabalho; (ii) ou reduzir proporcionalmente a jornada e salário.

Nessas duas hipóteses, o Governo Federal assumiria o pagamento de parcela que denominou de Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEPER), calculada sobre o valor que o empregado teria direito a título de seguro desemprego. Para a suspensão do contrato, o empregado receberia apenas esse BEPER. E no caso de redução salarial/jornada, uma parte seria arcada pelo empregador e a outra através do BEPER.

Sabe-se que a MP 936 provocou bastante polêmica na comunidade jurídica e recebeu muitas críticas, sobretudo da magistratura trabalhista, que, em boa parcela, a tacha de inconstitucional quando autoriza a celebração de acordo individual sem a participação sindical, como exige a Constituição Federal nas hipóteses de redução salarial (art. 7º, VI, p. ex). 

Este ensaio, porém, aborda uma intrincada questão que tem se tornado recorrente após a edição da referida MP: é possível celebrar acordo para redução de salário/jornada com os empregados enquadrados no art. 62 da CLT (leia-se cargo de confiança, serviço externo e teletrabalho), excluídos do regime da duração normal de trabalho previsto na CLT (artigos 57 a 75-E), em razão da natureza da atividade que desempenham na relação de emprego?

A dúvida decorre, basicamente, da seguinte peculiaridade: as três exceções previstas naquele dispositivo da CLT possuem, em comum, a circunstância de exercerem função incompatível com a estipulação, fixação e/ou controle de jornada, de modo que essa categoria de empregados  não faz jus a horas extras, pois não estão sujeitos, repita-se, à duração normal de trabalho, inclusive à jornada máxima prevista constitucionalmente.

Feita essa breve introdução, mas ainda antes de ingressar na problemática central deste trabalho, cumpre lembrar que o ocupante de cargo de confiança não está submetido ao regime de horas extras sob a justificativa de que “tais trabalhadores, por estarem investidos de parcela significativa do próprio poder empregatício, não se submeteriam, logicamente, a estrito controle de horários, sob pena de isso até mesmo inviabilizar o exercício precípuo de sua função de poder perante os demais trabalhadores”.

O teletrabalho, por sua vez, foi inserido no rol do art. 62 pela Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017) porque  “tais empregados, laborando em contexto que torna difícil ou até mesmo inviável o controle de jornada, não recebem a incidência de regras sobre duração do trabalho, horas extras/suplementares, intervalos trabalhistas etc”, o que o assemelha ao empregado que executa serviço externo, uma vez impossível aferir a jornada efetivamente cumprida.

Diante disso, muitos se deparam com o seguinte dilema: se os empregados inseridos no art. 62 da CLT não fazem jus a horas extras pelas peculiaridades do cargo que exercem, especialmente por não estarem sujeitos a um controle de horário, seria juridicamente viável celebrar um ajuste para redução de jornada, nos moldes da MP 936?

Tudo porque a redução salarial está atrelada exatamente a uma diminuição da carga horária, o que parece contrariar a natureza do cargo exercido por essas espécies de trabalhadores, na medida em que, repita-se, não estão obrigados a cumprir uma jornada pré-estabelecida e controlada pelo empregador.

Logo, eventual acordo que estipulasse redução proporcional de salário e jornada importaria, em tese, risco de se descaracterizar o acordo de redução salarial, o que ensejaria, em consequência, o pagamento de horas extras prestadas durante o vínculo de emprego.

Como primeira solução a este problema, poderia ser adotado o controle de horário do empregado enquadrado no art. 62 da CLT apenas no período de redução da jornada (máximo de 90 dias), com a garantia expressa de que, depois desse prazo, retornaria ao status anterior (sem fiscalização do horário). 

Ocorre que, uma breve pesquisa na nossa jurisprudência revela que vários julgados adotam como fundamento para afastar a aplicação do art. 62 da CLT justamente o fato de ter sido comprovado, em juízo, que a jornada podia ser aferida, controlada e/ou fiscalizada pelo empregador. 

Daí por que o acordo individual celebrado nesses termos e com controle de jornada no período, poderia induzir o juiz do trabalho, o fiscal do trabalho ou, ainda, o MPT, a entender que a jornada sempre foi “controlável”, o que poderia, assim, desnaturar o cargo de confiança, serviço externo ou teletrabalho.

Assim, se o controle de horário traria esse risco acima apresentado, deve ser analisado outro caminho para enfrentamento dessa questão. Neste passo, surge a possibilidade de adotar, como lícito e razoável, o entendimento de que o salário estipulado no contrato de trabalho corresponde àquela jornada ordinária fixada na Constituição Federal (8 horas diárias e 44 semanais).

Ora, a impossibilidade de controle de horário nessas hipóteses retira desses empregados a percepção de horas extras, mas não significa que o salário ajustado (contratual) foi estabelecido de forma aleatória, sem nenhuma vinculação a uma carga horária padrão ou usual.

Firmada, assim, a premissa de que o salário está parametrizado, em regra, a uma carga de 8 horas diárias e 44 horas semanais, salvo as jornadas especiais previstas em lei ou norma coletiva, poder-se-ia estabelecer uma “proporção” para fins de acordo de redução do salário/jornada.

Se é assim quando o empregado é admitido para exercer cargo de confiança, o mesmo raciocínio se aplica quando o empregado é designado, alçado ou promovido a cargo de confiança; ou quando o empregador altera o regime presencial para o teletrabalho no curso do contrato de trabalho. Tanto num caso como noutro o empregado auferia, antes da mudança, um salário mensal que corresponde a uma jornada de trabalho anteriormente pactuada.

Há de ser ressaltado, ainda, que na hipótese em que o empregado passou ao cargo de confiança, teletrabalho ou serviço externo durante a vigência do contrato de trabalho, esse entendimento acima ganha ainda mais força. Neste caso, é possível afirmar, com convicção, que seu salário atual foi concebido, desde a admissão, com base numa jornada contratualmente estabelecida.

Assim, o ingresso posterior do empregado em teletrabalho, por exemplo, não afastaria a premissa inicial de que ele foi contratado para laborar por “x” horas semanais, com o salário mensal de “y”. Em outras palavras, essa proporção jornada/salário seria levada pelo trabalhador para o seu regime de teletrabalho, haja vista, inclusive, a irredutibilidade salarial prevista na Constituição.

Há de ser ressaltado, ainda, que a restrição de mobilidade decorrente do isolamento ou distanciamento social decretado pelas autoridades sanitárias para o controle da pandemia provocou uma larga implantação do teletrabalho (home office). Posteriormente, a edição da MP 936, com a possibilidade de implantação da redução salarial/jornada para esses teletrabalhadores, traz um contexto fático que demonstra a abordagem oportuna do tema aqui proposto.

Não se pode afirmar, portanto, a priori, que a redução autorizada pela MP 936 não abrange os empregados inseridos na regra do art. 62 da CLT, pois incompatível com a atividade que desempenham, sob pena de se estimular atitude discriminatória, o que não é tolerado pelo direito, pois certamente seriam desligados por força da atual crise financeira. 

Em resumo, vislumbramos duas soluções para viabilizar o acordo de redução salarial/jornada para os empregados inseridos no art. 62 da CLT: (i) estabelecer, em caráter excepcional, um controle da jornada desses funcionários mediante cláusula específica no acordo individual ou, se for o caso, mediante acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho, durante o período de redução salarial/jornada; (ii) não se adotar nenhum controle, levando-se em conta que o salário do empregado foi estipulado para uma jornada padrão ou ordinária de 8 horas diárias e 44 semanais, utilizando-se esse parâmetro para fins de aplicação da redução.

Isto posto, com a ressalva dos diferentes graus de risco inerentes a esse tipo de alteração contratual, que podem variar de acordo com as circunstâncias específicas ou nuances do caso concreto, entendemos, salvo melhor juízo, ser possível o acordo de redução de salário/jornada nessas hipóteses.

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