O Nobel de Economia e as leis brasileiras para igualdade de gênero

O anúncio, em 9 de outubro, do Prêmio Nobel de Economia para a professora de Harvard Claudia Goldin, em reconhecimento por sua contribuição no avanço sobre a compreensão do resultado da participação das mulheres no mercado de trabalho, lança luz sobre um desafio ainda longe de ser superado.

As pesquisas de Claudia Goldin apresentam um relato abrangente das principais fontes da lacuna de gênero que insistem em permanecer. Goldin demonstrou, buscando em mais de 200 anos de história, que vários fatores influenciaram (e alguns ainda influenciam) a oferta e a demanda pelo trabalho feminino, trazendo um entendimento mais acurado de como e porque as taxas de emprego e remuneração diferem entre mulheres e homens.

As conclusões apontam que as mulheres continuam em grande medida sub-representadas no mercado de trabalho global e ainda ganham menos do que os homens. Historicamente, grande parte da disparidade de gênero nos ganhos poderia ser explicada por diferenças na educação e nas escolhas ocupacionais. Goldin aponta, contudo, que durante o século XX, os níveis de educação das mulheres aumentaram continuamente e são hoje, em países de alta renda, substancialmente mais altos do que os dos homens, com a participação das mulheres no mercado de trabalho em taxas cada vez mais semelhantes às masculinas nesses países. Mas as disparidades salariais persistem e parecem não se resolver. Nos países que compõem a OCDE, por exemplo, as mulheres ganham em média 13% menos do que os homens.

De fato, a participação igualitária no mercado não implica igualdade, já que existem disparidades de gênero em muitas outras dimensões. Como demonstram as pesquisas de Goldin, mulheres tendem a trabalhar em empregos com menos espaço para promoção e são significativamente sub-representadas nos conselhos de administração das empresas ou como CEOs. As diferenças de gênero nos ganhos e o “teto de vidro” nas promoções são fenômenos mundiais.

Ao examinar a forma como essas disparidades evoluem ao longo da carreira, Bertrand, Goldin e Katz (2010) mostraram que as diferenças de gênero dentro do mesmo tipo de ocupação surgem e se aprofundam em grande parte com o nascimento do primeiro filho, tendo como catalisador a inflexibilidade no local de trabalho.

De fato, o tempo em que a mulher permanece longe do emprego, bem como o retorno ao mercado de trabalho em horários mais reduzidos acabam gerando, no longo prazo, esse gap sobre a remuneração feminina. Além disso, empregos com horários flexíveis, que beneficiariam mulheres com crianças muito pequenas, são muitas vezes penalizados com um salário menor.

O trabalho de Goldin traz insights interessantes para formuladores de políticas públicas, apontando caminhos para reduzir as disparidades de gênero observadas. Uma conclusão particularmente importante é que são muitas as explicações para tais disparidades, dentre elas discriminação, normas sociais, expectativas de cuidados infantis, mudanças tecnológicas e estruturas do mercado de trabalho, e tais explicações não são, na maioria das vezes, mutuamente excludentes. Elas se transformam à medida que uma sociedade passa de um estágio de desenvolvimento para outro, sendo ideal considerar o contexto de cada país no delineamento de políticas de combate. As fontes de lacuna de gênero muitas vezes também interagem entre si. Nesse sentido, políticas voltadas a um único vetor podem ser insuficientes para produzir mudanças significativas.

Em linha com os estudos de Claudia Goldin, o Brasil vem aprovando, desde o ano passado, uma série de leis que procuram endereçar alguns dos problemas apontados. Em setembro do ano passado foi aprovada a Lei 14.457, que instituiu o Programa Emprega + Mulheres e estabeleceu diversas medidas para incentivar a empregabilidade feminina. Muitas medidas abrangem também os empregados homens, dada a definição de parentalidade na lei como “o vínculo socioafetivo maternal, paternal ou outro que resulte na assunção legal do papel de realizar as atividades parentais, de forma compartilhada entre os responsáveis pelo cuidado e pela educação das crianças e dos adolescentes”.

Dentre as disposições dessa lei destaca-se o apoio à parentalidade na primeira infância, com a autorização para que os empregadores adotem o benefício reembolso-creche, sem reconhecimento de natureza salarial, não se constituindo, portanto em base de incidência de FGTS, contribuições ao INSS ou desconto de imposto de renda na fonte, desde que atendidos os critérios requeridos pela norma.

Há previsões também de flexibilização do regime de jornada, com vagas de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho à distância prioritárias aos empregados com filho, enteado ou criança sob guarda judicial com até 6 anos de idade, e sem limite de idade nas hipóteses de deficiência. É permitida a antecipação de férias, sem transcurso do período aquisitivo, bem como a adoção do regime de tempo parcial, medidas que poderão ser adotadas até o segundo ano do nascimento da criança, ou, no mesmo período, a contar da adoção ou da guarda judicial.

A nova lei traz ainda disposições para estimular a qualificação de mulheres e o desenvolvimento de habilidades e de competências em áreas estratégicas ou com menor participação feminina (como ciência, tecnologia e inovação) e medidas de prevenção e combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no âmbito do trabalho.

Em 2023, mais duas leis endereçando questões de gênero no mercado de trabalho foram promulgadas: em abril, a lei 14.542, para dispor sobre a prioridade no atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar pelo Sistema Nacional de Emprego (Sine); e em julho a Lei 14.611, que dispõe sobre a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens, reafirmando o que já está previsto em nossa Constituição Federal e na própria CLT, e reforçando as medidas de garantia de igualdade salarial, com penalidades pelo descumprimento.

São medidas que devem ser comemoradas e vão ao encontro de outra lição importante do trabalho de Goldin para os formuladores de políticas públicas: a velocidade da mudança nas disparidades de gênero tende a ser lenta, em especial pela evolução vagarosa quanto às normas e expectativas sociais em relação a quem cuida das crianças e à própria expectativa das mulheres quanto à sua inserção no mercado após a maternidade.

Como destacado pelo Comitê para o Prêmio Nobel de Economia, se as mulheres são tratadas de forma desigual no mercado de trabalho, isso não é apenas uma questão de equidade, mas também uma questão de eficiência econômica. A alocação de mão de obra será ineficiente se os trabalhadores não forem designados para os empregos mais adequados às suas habilidades. Tais ineficiências levam a grandes custos econômicos para toda a sociedade. O Prêmio Nobel de Economia para Claudia Goldin veio em boa hora!

 

 

Artigo publicado no Valor Econômico.

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