Foi publicada, pelo Ministério do Trabalho e Previdência, a Portaria nº 620/21, de 01 de novembro de 2021, que considera, dentre outros pontos, discriminatória a despedida de trabalhador em razão da recusa injustificada em se vacinar. Praticado o ato pelo empregador, o empregado poderá optar entre a reintegração, com ressarcimento integral dos salários, ou o pagamento em dobro da remuneração relativa ao período de afastamento. O ato discriminatório também se configura, segundo o MTE, na fase de seleção e contratação do trabalhador.
A Portaria contraria a diretriz que estava sendo seguida pela maioria das empresas, com o respaldo do Ministério Público do Trabalho e da jurisprudência, no sentido de exigir dos seus colaboradores a comprovação das duas doses da vacina, como condição de permanência no trabalho, sob pena de aplicação de penalidades, inclusive a despedida por justa causa.
O entendimento é amparado no direito coletivo (e individual) a um meio ambiente do trabalho salubre, saudável e seguro. Desse direito do trabalhador, constitucionalmente assegurado (art. 7º, XXII e 225 da CF), decorre o dever de o empregador zelar por um meio ambiente do trabalho seguro, de modo que essa obrigação (e possibilidade de responsabilização pelo contágio e suas consequências) respalda a exigência da comprovação da dupla dose de vacinação para todos os colaboradores.
Até o momento, do ponto de vista científico, prevalece o entendimento de que a vacina impede o avanço do coronavirus, mitigando o contágio, a desenvolvimento da doença, sobretudo o seu agravamento/sequelas e mortes.
Como se vê, a Portaria do MTE, conflita com as normas inseridas na Carta Magna, além de extrapolar e muito a sua finalidade como ato administrativo interno ao invadir a competência do Poder Legislativo, a quem compete, exclusivamente, a criação de direitos e obrigações que se aplicam às relações de trabalho. Uma Portaria, sob o viés Constitucional, não pode criar direitos, impor obrigações e penalidades a particulares.
Nesse sentido, recomendamos que nossos clientes continuem a exigir a dupla dose da vacinação dos seus empregados, orientando-os e justificando a sua necessidade. Contudo, enquanto a insegurança jurídica causada pela Portaria não for sanada definitivamente por uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – que deve ser proposta por alguma entidade coletiva constitucionalmente legitimada (art. 103 da CF) –, poderá o empregador valer-se, em cada caso concreto (de rescisão por justa causa), da ação declaratória (artigo 19 do CPC) ou, analisar a viabilidade do ajuizamento de uma “Ação Coletiva Passiva[1]”, a ser proposta contra o Sindicato dos Trabalhadores de determinada categoria profissional.
Valton Pessoa[2]
[1] Fredie Didier, in curso de direito processual civil, vol. IV
[2] Mestre e Doutor em Direito do Trabalho pela PUC/SP, sócio do Pessoa e Pessoa Advogados