STJ permite que bem de família fique indisponível

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é possível decretar a indisponibilidade de um bem de família, mesmo considerando que é impenhorável. A decisão reforça a legalidade do uso de medidas cautelares chamadas de atípicas – como bloqueio de CNH, passaporte ou chave PIX – para pressionar devedores a quitar o que devem. Não cabe mais recurso.

A impenhorabilidade do bem de família foi instituída pela Lei nº 8.009, de 1990. O objetivo da legislação é proteger o direito constitucional fundamental à moradia e à dignidade humana. Mas é comum que o imóvel seja vendido para que o dono se mude para outro lugar mais em conta e fique com a diferença.

Com a decisão, um imóvel poderá ser incluído no sistema da Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB). Vai aparecer na matrícula, registrada em cartório, que ele está indisponível. Na prática, portanto, o julgamento da 3ª Turma, unânime, impede a comercialização do bem de família.

A decisão é importante, segundo Elias Marques de Medeiros Neto, sócio do escritório TozziniFreire e especialista em Processo Civil, porque o uso do CNIB nas demandas cíveis já foi impedido pelo STJ, como sendo uma medida atípica (Resp 1963178).

O Código de Processo Civil (CPC) estabelece que o juiz pode determinar “todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária” (artigo 139 inciso IV). Segundo Medeiros Neto, isso passou a permitir que se chegue mais rápido no patrimônio do devedor, por meio de meios executivos atípicos, que incentivam o pagamento.

Esse dispositivo do CPC já foi questionado no Supremo Tribunal Federal (STF). Embora a Corte tenha declarado que ele é constitucional (ADI 5941), há uma grande divergência na doutrina sobre quais seriam os limites para a sua aplicação.

“A própria 3ª Turma do STJ já decidiu que a medida atípica deve ser usada de forma subsidiária, ou seja, após esgotados os outros meios de cobrança”, afirma Medeiros Neto. “Também entendeu que devem ser observados os princípios do contraditório e da proporcionalidade.”

Segundo o especialista, será o enfrentamento do Tema 1137 pelo STJ, em recurso repetitivo, que esclarecerá quais são os critérios para a sua aplicação. A decisão orientará os magistrados da primeira e segunda instâncias do Judiciário.

Para Medeiros Neto, a decisão que permite a inclusão do bem de família na CNIB também é relevante por diferenciar a impenhorabilidade da indisponibilidade. A finalidade da primeira é garantir o direito à moradia. “Se um bem é decretado como indisponível, isso significa que ele não poderá ser vendido sem que o devedor se regularize do ponto de vista financeiro, mas ele não perde o patrimônio”, afirma.

No caso concreto, foi proposta uma ação de execução de título extrajudicial pela Cooperativa de Crédito, Poupança e Investimento Vale do Piquiri e ABCD – Sicredi Vale do Piqueri contra dois devedores. A primeira instância deferiu o pedido de indisponibilidade do bem de família dos devedores pela CNIB. Eles recorreram, mas o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) negou o pleito.

Inconformados, eles apresentaram recurso especial ao STJ para pedir o levantamento da averbação de indisponibilidade. Apontaram violação aos artigos 1º e 3º da Lei Federal nº 8.009, de 1990, pois “em razão da impenhorabilidade da pequena propriedade familiar, o bloqueio e a indisponibilidade desse mesmo imóvel se tornam inviáveis”.

Segundo o voto da ministra relatora Nancy Andrighi, “a ordem de indisponibilidade por meio da CNIB poderá recair sobre bens de família, pois não impede a lavratura de escritura representativa de negócio jurídico e não afronta a proteção da impenhorabilidade, mas dá ciência da dívida a terceiros, coagindo os devedores ao pagamento”.

A ministra lembrou ainda que, de acordo com o artigo 185-A do Código Tributário Nacional (CTN), “na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos”.

Para o advogado Lucas Menezes, sócio do contencioso cível do escritório Pessoa e Pessoa Advogados, a decisão da 3ª Turma é muito importante do ponto de vista do credor, “que passa a ter mais um instrumento para obter o crédito ao qual tem direito”.

Contudo, o advogado alerta que a recente decisão deve gerar alguma instabilidade na jurisprudência da Corte. “As turmas de Direito Privado e Público do STJ têm entendimentos opostos sobre a inclusão de bem de família no CNIB”, afirma. “No caso de dívida tributária, não seria possível usar o CNIB como instrumento coercitivo, mas no caso de dívida na esfera privada sim”, acrescenta. Para ele, isso pode fazer com que o STJ seja provocado a levar o tema para Corte Especial se manifestar a respeito.

Se um bem é declarado indisponível, sua venda é dificultada para evitar o esvaziamento patrimonial do devedor, a chamada fraude à execução, destaca Rafael Penido, advogado do escritório Barbosa Castro & Mendonça Advogados Associados. “O comprador saberá que, embora o bem não possa ser levado à leilão, por ser impenhorável, o proprietário é executado [devedor]”, diz.

“Já vi caso de morador de imóvel de alto padrão que teve que vender o bem de família para quitar o condomínio e o IPTU. A indisponibilidade do imóvel dificultaria essa transação”, afirma Penido. “Por isso, a decisão do STJ é um importe precedente.”

Já o advogado Ricardo Trotta, sócio-fundador de uma banca que leva o nome dele, lembra que há uma alternativa à venda. Segundo o especialista, a jurisprudência permite também que o bem de família seja alugado. Basta que com o fruto desse aluguel o dono pague o aluguel de um outro imóvel para morar.

“Recentemente, uma pessoa que mudou de emprego, para um local muito distante do endereço do bem de família, fez isso para facilitar o trajeto ao trabalho”, diz. “Há jurisprudência favorável, por exemplo, no Tribunal de Justiça de São Paulo e no do Paraná [TJSP e TJPR]”, conclui (respectivamente agravos de instrumento nº 2129390-52.2024.8.26.0000 e 0073644-86.2022.8.16.0000).

 

Artigo publicado no Valor Econômico.

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